REFLEXÕES SOBRE O MUSEU VIRTUAL
MONIQUE BATISTA MAGALDI
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
TEREZA CRISTINA SCHEINER Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
RESUMO: O trabalho propõe uma análise das relações entre a Museologia e o virtual utilizando, como objeto de estudo, o museu virtual Pierre Lévy define virtual como sendo, segundo o vocabulário filosófico, algo não estático. A origem do termo seria o latim virtualis, derivado de virtus, que significa força, potência: a árvore, por exemplo, estaria virtualmente presente na semente. O virtual está em transformação, implica complexidade. É problemático e circunstancial. Não soluciona, problematiza, por possuir um grau de indeterminação de seu processo. Implica liberdade. É entendido como um constante ‘vir a ser’. É virtual, portanto, o que está em constante transformação. Deste modo, caberia perguntar se a internet, como meio de manifestação, seria o único qualificador do museu virtual. Para aprofundar tais reflexões, são apresentadas comparações entre o que a Museologia denomina “museu virtual” e outras manifestações do fenômeno Museu. A abordagem se complementa com levantamento bibliográfico, entrevistas e a análise de dois exemplos de museus: o Museu da Pessoa (Brasil) - enquanto museu virtual eletrônico, webmuseu ou cibermuseu, existente apenas na Internet; e o Museu Temporário da Mudança Permanente (Temporary Museum of Permanent Change), localizado em Salt Lake City, Utah, EUA, enquanto museu que se constitui fora da Internet.
PALAVRAS-CHAVE: Museu. Museologia. Virtual. Internet. Museu Virtual.
ABSTRACT:
The paper analyses some relationships between Museology and the concept of virtual – using, as object of analysis, the virtual museum. Pierre Lévy defines ‘virtual’ according to the vocabulary of philosophy, as something that is not static. The origin of the term would be the Latin virtualis, derived from virtus, that signifies force, potency: the tree, for example, would be virtually present in the seed. The virtual is in process, implies complexity. It is problematic and circumstantial. It does not bring solutions, but problems, since it contains a degree of indetermination. It implies freedom, being understood as a permanent ‘to-be’. Virtual would thus be something that is in constant process of change. Therefore, it might be asked whether the internet, as a medium of manifestation, would be the unique qualifier of the virtual museum.The approach is complemented with the analysis of two examples of existing museums: the Museum of the Person (Museu da Pessoa, Brazil) – as an electronic virtual museum, webmuseum or cybermuseum, existent only in the internet; and the Temporary Museum of Permanent Change, in Salt Lake City, Utah (USA), as a museum organized out of the internet.
1.INTRODUÇÃO:
Este trabalho aborda idéias desenvolvidas na dissertação de Mestrado intitulada “NAVEGANDO NO MUSEU VIRTUAL: um olhar sobre formas criativas de manifestação do fenômeno Museu" - que discute aspectos relativos ao conceito de museu virtual, buscando relacionar o surgimento e desenvolvimento do termo às transformações ocorridas, nas últimas décadas, na concepção de Museu. A pesquisa empreendida ao longo de dois anos revelou algumas facetas pouco estudadas sobre o tema, especialmente no que tange ao tratamento dado pelo campo da Museologia ao conceito de virtual e às tendências e movimentos de apropriação do conceito de Museu por campos disciplinares afins. Entendemos como ponto de partida a idéia de que, desde o início do processo de consolidação do campo, a “investigação sobre o conceito de Museu esteve [...] associada aos estudos teóricos da Museologia”1. Museu é o conceito fundador do campo disciplinar Museologia e, por isso, faz-se importante o seu estudo, uma vez que a Museologia “ganha identidade e razão de ser, seja como filosofia ou como ciência”2, baseada no desenvolvimento e na análise cuidadosa de terminologias definidas a partir de conceitos próprios / específicos. Analisando “Museu e Museologia por uma perspectiva processual, compreendemos que estas se encontram sempre em movimento, e se constituem/reconstituem na interface entre os demais saberes e práticas sociais”3, configurando um ‘campo híbrido’4, originário ‘do cruzamento de fronteiras disciplinares’5. Lima e Mendes6 recordam que o território da Museologia se enquadra no padrão das formas culturais nomeadas ‘sistemas simbólicos’7, campos regionalizados da produção simbólica que articulam as significações culturais. Como campo híbrido de produção do conhecimento na esfera cultural, a Museologia apresenta “terminologia identificada como linguagem de especialidade ou linguagem profissional, que se apóia e expressa por meio de termos [e conceitos explicativos] (...) por sua vez, constitutivos da informação especializada”8. Para os autores, a linguagem, manifestação cultural do sistema simbólico, seria um dos instrumentos de legitimação do campo da Museologia, configurando o padrão informacional e comunicacional da área, atuando como elemento de integração entre os seus representantes e facilitando a interlocução com as diferentes instancias do corpo social.
Compartilhando tal pensamento, lembramos que a “linguagem museológica ainda não se encontra devidamente estruturada”9. Vale ressaltar que, percebendo a importância do estudo dos termos e dos conceitos que fundamentam o campo, buscamos uma aproximação com alguns termos e conceitos que formam a base da Museologia – entre eles, o de Museu, que se desdobra em outros conceitos, entre os quais o de museu virtual. A discussão do que vem a ser museu virtual é complexa e carece de mais trabalhos que tratem este tema, em especial no campo da Museologia. Entre os poucos autores brasileiros com vivência no campo e cujos trabalhos vêm contribuindo para essa discussão, destacam-se Carvalho (1998, 2005, 2009,2008), Lima e Mendes (2009), Lima e Costa (2007, 2009), Miranda (2001), Loureiro (1998, 2003, 2009) e Scheiner (1998, 1999, 2004, 2006, 2007, 2009). Por mais que estes autores não constem no decorrer deste artigo, devido ao recorte proposto neste trabalho, é fundamental citar as referidas produções, devido à importância destas referências para o estudo dos Museus Virtuais.
Segundo Loureiro, Pela perspectiva da Ciência da Informação, os museus são compreendidos como produtores de informação. A autora comenta que alguns museus existentes na Internet, mas também existentes em meio físico utilizam nomeações como webmuseu, cibermuseu, museu digital ou museu virtual. Paralelamente, foram também criadas possibilidades de museus sem similares em meio físico, só existindo na Internet. Estes possuem “acervos”, “formados por reproduções digitais ou por obras-de-arte criadas originalmente em linguagem digital”. Para a autora, "tal nomeação sugere uma idéia de museu permeada pela centralidade da informação, e não mais pela materialidade dos lugares e dos objetos físicos [...]". Pela perspectiva do campo da Comunicação, os museus alinham-se aos meios e processos comunicacionais. Contudo, vale ressaltar que toda comunicação possui informação.
Ainda no campo da Comunicação, lembremos que os estudos pioneiros de Cameron (1968), Knetz e Wrigth (1970), os quais “abordam a cadeia emissor-meio- receptor-feedback, baseada na teoria da informação e na concepção de comunicação como transferência ou transmissão de informação” 13. Ao falarmos sobre museu virtual, verificaremos que muitos são os trabalhos que restringem a idéia de virtual como algo inerente à Internet. Existem hoje, disponíveis on line, inúmeros museus e experiências de caráter museológico que se autodenominam e/ou são reconhecidas como “museus virtuais”. Uma análise mais detalhada mostraria que poucas destas experiências seriam consideradas, efetivamente, museus virtuais eletrônicos. Uma das maneiras de o Museu se manifestar é através das tecnologias digitais, especialmente através da Internet ou Grandes Rede de Computadores. Se entendermos a Internet - constituída por uma rede de computadores distribuídos mundialmente (e, por isso, fazendo uso de hardware e software) - como meio de transmitir informação, algumas considerações merecem destaque. Seria o meio de manifestação do Museu (via Internet) o seu qualificador enquanto digital ou virtual? Quando se constrói um texto utilizando os dispositivos computacionais - sejam programas ou hardwares – o processo de construção (restrito a um computador ou na Internet) é aleatório, podendo se dar de formas diversas, quase infinitas. Já a codificação do texto pela perspectiva dos dispositivos computacionais é algo contido, calculável, uma vez que a informática ”não oferece senão uma combinatória, ainda que infinita, e jamais um campo problemático”. Aqui, o que se tem é o digital. Segundo Lévy, o digital, enquanto modo de ser, não é complexo. É fechado, limitado - e, por ser baseado nos dispositivos computacionais, já nasce constituído. Contudo, o autor chama a atenção para o que é produzido a partir da relação entre os dispositivos computacionais e o ser humano. A informação - texto, imagens, sons - é apresentada através do computador ou dispositivos conectados à Internet, sob a forma de informações, textos, imagens, sons digitais. Sozinhos, estes dispositivos são fechados, não problematizáveis.
A dimensão virtual se realizaria pela inclusão do ser humano neste processo, pois é com a "entrada da subjetividade humana no circuito, quando num mesmo movimento surgem a indeterminação do sentido e a propensão do texto [ou imagem ou som] a significar15", que se revelam as tensões que só se realizarão pela leitura - mediante a atualização ou interpretação dos muitos significados. Assim, só existe complexidade, problemática, quando associamos “humanos-máquinas e não processos informáticos apenas”16. Esta pode ser uma perspectiva para análise e entendimento da manifestação do museu virtual em meio digital. Enquanto dispositivos computacionais, comecemos por considerar os museus eletrônicos, visitados através da Internet. Resultantes de um processo iniciado na década de 1940 e plenamente realizado nos anos 1990, os museus que se realizam via Internet provêm das grandes transformações tecnológicas desencadeadas em 1945, com o advento dos primeiros computadores, inicialmente utilizados por militares para fins de cálculos científicos e posteriormente (anos 1960) disseminados para uso civil. Naquele momento, não se podia imaginar que, no futuro, haveria uma dispersão da “tecnologia da virtualização” pelo mundo, através da Internet - ainda que alguns indicadores já apontassem nesta direção. Os museus virtuais surgiram a partir destas transformações. A Internet vai possibilitar a compreensão do conceito de virtual. Contudo, o estudo da origem do termo ‘virtual’ nos possibilitará compreender que virtual não está na instância da imaterialidade, uma vez que virtual é diferente de imaterial. Para aprofundar esta reflexão, é fundamental antes refletirmos sobre outros termos e expressões pertinentes a esta discussão.
2. NOVAS TECNOLOGIAS, NOVOS TERMOS E CONCEITOS
Ao tratar sobre museu virtual, percebemos a necessidade de referenciar termos e expressões transversais, tais como: online, hipermuseu, cibermuseu, webmuseu; vemos ainda que muitos são os trabalhos que se restringem ao conceito de virtual como algo inerente à Internet, uma vez que os primeiros museus virtuais da década de 1990 surgem em meio eletrônico, via rede de computadores. Este trabalho discute, entre outras coisas, a possibilidade da existência de museus virtuais fora da Internet. Na Museologia, o virtual é comumente associado a coisas imateriais ou que sejam criadas por computador. Os museus virtuais se apresentam, por exemplo, tanto como páginas eletrônicas de museus existentes em ‘meio físico’, quanto como museus criados exclusivamente na Internet. Esta ambigüidade mostra-nos a ausência de bases conceituais na construção destes espaços, tanto no que diz respeito ao entendimento do que seja museu, quanto do que venha ser virtual. Existem hoje,
disponíveis na Internet, inúmeros museus e experiências de caráter museológico, que se autodenominam e/ou são reconhecidas como museus virtuais. Contudo, consideramos que existam poucas experiências que possam ser assim chamadas, fetivamente, museus virtuais eletrônicos.
Na Internet, podemos encontrar diversas designações para esses museus: museu eletrônico, hipermuseu, museu digital, museu online, cibermuseu, webmuseu e museu virtual. Contudo, não há consenso nos limites terminológicos, no momento de nomear determinada experiência de museu na Internet. Tentaremos, então, refletir sobre cada termo. Para refletirmos sobre o que pode ser um museu eletrônico, utilizamos a raiz do termo. É eletrônico tudo o que possui um sistema baseado em experiências com eletricidade. Segundo o Brittanica Online Dictionary, o termo eletrônico existiria
desde 1902 enquanto adjetivo, estando relacionado a elétrons; ou relacionando-se a um dispositivo construído por métodos ou dispositivos baseados em princípios eletrônicos, ou implementados por intermédio de computador eletrônico. Podem ser eletrônicas as músicas geradas ou modificadas por aparelho eletrônico como, por exemplo, um órgão eletrônico. Pode também ser entendido como eletrônico algo relacionado ou proveniente de um meio pelo qual a informação é transmitida eletronicamente - por exemplo, a televisão. O museu eletrônico poderia, por esta perspectiva, ser compreendido como abrangendo todos os museus que existem ou se manifestam por meio de aparelhos eletrônicos.
Outro termo utilizado por alguns autores é o hipermuseu. Segundo o Merriam- Webster’s Online Dictionary, o prefixo Hyper- (proveniente do grego, derivado do latim hiper) pode ser entendido como algo acima, além, super, extremamente ativo ou algo excessivo (hipersensitivo), ou o que existe em um espaço de mais de três dimensões, pontos de transição/conexão em uma entidade (como um banco de dados ou de rede). Por exemplo, quando este prefixo é associado ao termo mídia, gera um novo termo - a hipermídia, que seria um tipo de banco de dados semelhante ao hipertexto e no qual texto, som ou imagens de vídeo relacionam-se em uma tela, que pode ser acessada diretamente no visor. Quanto ao adjetivo Hyper, este existiria desde 1942, referindo-se a algo extremamente ativo, nervoso, excitável. Nesta perspectiva, Hipermuseu poderia ser entendido como um tipo de museu acessível em um visor, com possibilidades de conexão, links, ativo e com grande potencial de interatividade. Para podermos compreender um pouco como isso se processa, citemos Lévy, para quem a tela do computador ou, como ele prefere chamar, ‘a tela informática’ é “uma nova máquina de ler, um lugar onde uma reserva de informação possível vem se realizar por seleção, aqui e agora, para um leitor particular”. Ele considera o computador, “antes de tudo, um operador de potencialização da informação”, no qual, “a partir de um estoque de dados iniciais, de um modelo ou de um metatexto, um programa pode calcular um número indefinido de diferentes manifestações visíveis, audíveis e tangíveis, em função da situação em curso ou da demanda de usuários”.
Para ele, é somente “na tela, ou em outros dispositivos interativos, que o leitor encontra a nova plasticidade do texto ou da imagem, uma vez que [...] o texto em papel (ou o filme em película) forçosamente já está realizado por completo”. No que se refere aos webmuseus3, estes seriam, na opinião de Loureiro, “sítios construídos e mantidos exclusivamente na Web, destinados a reunir virtualmente e a expor [objetos gerados] originalmente por processos de síntese, ou, por meio de cópias digitais, [objetos] que existem (ou existiram) no espaço físico"4. As características da Internet lhes conferem configuração hipertextual, [...]propiciando a conectividade e ampliando as possibilidades de interação com a obra, cuja(s) abertura(s) é(são) evidenciada(s) e/ou potencializada(s), além de condições peculiares de acesso, eliminando empecilhos espaciais e temporais e impondo, por outro lado, restrições de ordem cognitiva e tecnológica, assim como barreiras lingüísticas.
Já para entender o que seria o museu online, o termo. Segundo o Merriam-Webster’s Online Dictionary,o termo online faria referência a algo conectado, servido por, ou disponível através de um sistema, especialmente, de computador ou sistema de telecomunicações (como a Internet). Museu online seria, assim, uma categoria de museu baseado em um sistema de conexão. Hoje, as conexões são estabelecidas via rede conectada à Grande Rede Mundial de Computadores - e podem ser realizadas via telefonia, geralmente baseadas em um sistema de cabos de rede eletrônicos (transferência de dados através de elétrons); ou por meio de cabos de fibra óptica, estruturados em um sistema fotônico (transferência de dados através de luz). Mas existe também a conexão baseada em ondas de rádio - radiações eletromagnéticas, baseadas em ondas eletromagnéticas, cuja freqüência está na faixa de 30Mhz a 3Ghz. Vale lembrar que, para Wertheim, o domínio online é “um espaço de dados”. Este seria o conceito presente na obra Neuromancer, de Gibson - na qual, ao acessar determinado espaço por meio de um dispositivo como, por exemplo, um ‘capacete de dados’ ciberespacial, pessoas eram projetadas para um espaço virtual de dados “pela força do ilusionismo tridimensional gerado pelo computador”. Assim, seria possível acessar dados disponibilizados somente nestes espaços ilusórios. A respeito do termo Cyber, o Merriam-Webster’s Online Dictionary o refere como relativo ao que envolve computadores ou redes de computadores - levando-nos a inferir, num primeiro momento, que Cibermuseu seria uma categoria de museu existente na Internet ou que se manifesta através do computador.
Outra palavra derivada de cyber seria cibernética - inicialmente usada pelo físico André Marie Ampère em 1834, para designar a ciência que se ocupa dos modos de governo. Na sua atual significação, teria sido usado nos anos 1940 pelo físico Norbert Wiener, como sendo a ‘ciência do controle e da comunicação entre seres vivos e as máquinas’. O controle seria o processo de envio de mensagens que alterariam o comportamento do sistema receptor. Já a cibercultura seria o conjunto das expressões culturais que se dão no ciberespaço, tais como “transações comerciais, econômicas e sociais”. O ciberespaço é aqui considerado “como um espaço semântico/semiótico, onde o signo se dá em várias semióticas, desterritorializado, nômade, em escrita especializada e com a memória em constante modificação”. Wertheim, entretanto, comenta que ele não seria mais do que um mero espaço de dados, pois “grande parte do que ali se passa não está voltado para a informação”. Seria usado fundamentalmente "não para coleta de informação, mas para interação social e comunicação [...] e também, cada vez mais, para entretenimento interativo, o que inclui a criação de uma profusão de mundos de fantasias online em que as pessoas assumem elaborados alter egos". A idéia do ciberespaço remete às próteses tecnológicas, através das quais se modifica a relação entre o humano e a máquina - tão bem descritas em obras como Neuromancer, que trata de “uma inteligência artificial que busca o domínio humano e das máquinas” e onde o “o cérebro estaria ‘plugado’ em programas, próteses entre tecnologia e neurologia”.
Para o autor da obra ciberespaço seria “uma representação física e multidimensional do universo abstrato da 'informação' [...] Um lugar pra onde se vai com a mente, catapultada pela tecnologia, enquanto o corpo fica pra trás
um espaço imaginário criado por uma rede universal de computadores contendo todo o tipo de informação, onde os dados poderiam ser obtidos através dos diversos sentidos do corpo humano39. Gibson se refere a esta realidade como Uma alucinação consensual vivida diariamente por bilhões de operadores autorizados, em todas as nações, [...] Uma representação gráfica de dados abstraídos dos bancos de dados de todos os computadores do sistema humano. Uma complexidade impensável. Linhas de luz abrangendo o não-espaço da mente; nebulosas e constelações infindáveis de dados. Como marés de luzes da cidade.
As novas tecnologias são aqui apresentadas como fluxos que se desdobram sobre os seres humanos, criando novos indivíduos e novos ambientes, num construto que "problematiza a noção de sujeito, os conceitos de realidade, tempo e espaço”. Para Lévy, ciberespaço seria o “espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores” - podendo abrigar um amplíssimo universo de informações que se estenderia além da infra-estrutura material da comunicação digital para incluir os seres humanos que nele navegam e que o alimentam. Tais idéias são contestadas por autores como Koepsell, para quem o ciberespaço não teria nada de especial ou estranho, reduzindo-se a um meio configurado por dispositivos que permitem e realizam o armazenamento e a manipulação de bits: "O software existe no ciberespaço como o texto existe no papel ou como uma estátua existe em pedra". Outros autores consideram o ciberespaço como sinônimo de Internet ou Grande Rede de Computadores, algo que provê a base material para o funcionamento das NTICs - meros sistemas de comunicação.
Ou ainda como um espaço real, porém não físico, um universo virtual proporcionado pelas redes de telecomunicações - um novo mundo, um novo espaço de significações, um novo meio de interação, comunicação e de vida em sociedade: Esse universo não é irreal ou imaginário, existe de fato, e o faz em um plano essencialmente diferente dos espaços conhecidos. [...] possibilita o surgimento de uma nova era da sociedade humana, uma revolução análoga à invenção da escrita. No entanto, trata-se de um novo meio, um local ainda desconhecido, começando a ser explorado. O ciberespaço implica uma nova relação de tempo e espaço. O espaço não é mais concreto, localizado em um território, mas um espaço cibernético, virtual, abstrato. O tempo não é mais linear, não é mais o tempo da História, cronológico; é o tempo real, o agora e atual.
Já são bem conhecidas as novas relações espaço-tempo que se dão no ciberespaço, com as informações disponibilizadas em tempo real (o “agora”) e contidas no próprio ciberespaço, ilimitado. É impossível visualizar o tamanho, a dimensão desse espaço virtual: pode-se buscar (e encontrar) qualquer informação e conhecimento disponíveis na rede, "independente de onde ou como eles tenham sido integrados à mesma, ou se alguém está, simultaneamente, fazendo uso desses mesmos recursos. [...] As figuras do tempo são representadas por pontos e segmentos, pela velocidade pura, sem horizonte”. As mudanças na unidade de tempo não necessariamente alteram a unidade do espaço: isto somente seria possível através das interligações das redes eletrônicas, como podemos perceber em sistemas de telepresença, por exemplo.
O ciberespaço pode ser descrito com o uso dos termos 'teia' e 'rede': ele se constrói e expande exponencialmente, num incessante engendramento de novas conexões - e cada novo nó de conexão “se torna ele próprio um eixo a partir do qual novos nós podem brotar”. Este processo se acelera a partir da década de 1990, com a expansão da Internet para a escala global: em 1998, o World Wide Web alcança mais de trezentos milhões de páginas; os ‘cidadãos da Internet’ passam a ter e-mail, podendo receber mensagem de qualquer lugar do mundo; os negócios "marcam presença no ciberespaço” - e as empresas passam a ter sites na Internet. Wertheim considera o ciberespaço também um “subproduto tecnológico da Física”, assim como
os “chips de silício, as fibras óticas, as telas de cristal líquido e os satélites de comunicação".
Contudo, aprofundando a questão, esse “novo espaço digital está ‘além’ do espaço que a física descreve, pois o ciberdomínio não é feito de forças e partículas físicas, mas de bits e bytes”. Pela Teoria da Complexidade, “o ciberespaço é um fenômeno emergente, algo que é mais que a soma de suas partes”, um novo fenômeno ‘global’ que “emerge da interação da miríade de seus componentes interconectados, e não é redutível às leis puramente físicas que governam os chips e as fibras de que inevitavelmente provém” . Para Wertheim, embora destituído de fisicalidade, o ciberespaço é um espaço real, pois “eu estou lá – seja qual for o significado final desta afirmação”: quando algo não é material, “não significa que é irreal”. As definições acima encontram-se em aberto. Tratam-se de ponderações quanto aos termos com os quais, constantemente, nos deparamos, quando os assuntos são: Internet, digital e virtual. Loureiro comenta como é difícil “nomear um fenômeno novo, para o qual as palavras mostram-se insuficientes ou são impróprias” .
3.A CIBERCULTURA E O MUSEU VIRTUAL
As mudanças no ambiente de pensamento trazidas pelas novas tecnologias vêm influenciando de forma determinante o modo como se pensa e se atua o Museu. Uma série de experiências, realizadas com o auxilio das novas tecnologias, vem sendo desde então designadas como 'museus' e nomeadas com alguns novos termos criados especificamente para essas novas situações: museu eletrônico, webmuseu, cibermuseu, museu digital, museu virtual. A Museologia volta-se hoje, com especial empenho, para a análise dessas experiências, buscando especificar as relações entre elas, os conceitos gerados, os termos pelos quais são designadas e os fundamentos teórico-metodológicos do próprio campo. Lembremos que, desde meados dos anos 1980, vem sendo possível realizar a digitalização dos acervos de museus tradicionais - sendo as cópias gradativamente
armazenadas em meio digital, na memória de um computador. Com o advento da Internet, estas imagens puderam ser acessadas/ visualizadas em qualquer computador que tenha conexão com a rede mundial de computadores. Este é também o momento em que se inicia a consolidação da Museologia, legitimando os estudos e debates que vinham se desenvolvendo, desde os anos 1930, sobre a sua natureza como campo e a sua relação com outros campos disciplinares. Uma das questões centrais desse período é o reconhecimento de interfaces entre a Museologia e a Ciência da Informação. Entre os trabalhos pioneiros do período destacam-se os de Bernard Deloche que, em 1989, identifica, como verdadeira meta da Museologia a de ser "uma lógica que se situe no cruzamento dos mais diversos domínios”; e o estudo sistemático sobre termos e conceitos da Museologia, empreendido a partir de 1993 por um grupo de teóricos do Comitê Internacional de Museologia (ICOFOM), sob a direção de André Desvallés.
O desenvolvimento da Museologia como campo e o amadurecimento da reflexão teórica sobre o fenômeno Museu e suas representações permite, a partir de então, perceber o Museu e o patrimônio "em pluralidade (não como Um, mas Muitos), e ainda admitir a existência de um museu e de um patrimônio virtuais, originados nos múltiplos cruzamentos entre a criação e a informação"; compreende-se também que "patrimônio e museu têm uma face intangível - não de coisa dada, mas que se configura em ato, no momento da relação" . O museu virtual começa a ser percebido enquanto Manifestação imagética das novas tecnologias da informação e da comunicação. Desterritorizado, existe apenas em processo, na memória do computador ou nos aparatos de realidade virtual. Recria-se continuamente, e não tem limites. No Museu virtual, o homem tem relação inusitada com o tempo, o espaço, a matéria e com a sua própria capacidade de criar e de pensar –se. A base do Museu Virtual é a informação.
Para Scheiner, o museu virtual é a representação por excelência do fenômeno Museu na contemporaneidade: "impessoal, pode ser o museu de um só autor ou o resultado de uma colagem; intemporal, existe apenas no presente; imaterial, independe da existência prévia de testemunhos, podendo surgir pela presentificação imagética das imagens e sensações do museu interior" Desterritorializado, "é o museu do não-lugar - e simultaneamente de todos os lugares, pois entra em rede e alcança o mundo em tempo real"; pode ainda existir nos pequenos aparatos individualizados da ‘realidade virtual’ - que, "colocados na cabeça de um indivíduo, literalmente o projetam para dentro da imagem". A possibilidade de pensar o Museu para além da fisicalidade permite que o campo da Museologia direcione parte da sua produção teórica para a análise e o debate das múltiplas possibilidades e experiências oferecidas pelo meio digital. Entre as experiências, destaca-se o estudo da criação, no ambiente Internet, de ‘sítios’ que se auto-denominam “museus ou webmuseu, cibermuseu, museu digital e/ou museu virtual. Entre estes, podemos destacar os museus que constituem exclusivamente na Internet, com acervos “formados por reproduções digitais ou por obras-de-arte criadas originalmente em linguagem digital”.
Para Carvalho, "Os museus no ciberespaço se caracterizam pela imaterialidade, ubiqüidade, provisoriedade, instabilidade, caráter não necessariamente institucional, hipertextualidade, estímulo à interatividade e tendência à comunicação bi ou multidirecional62. Loureiro chama a atenção para outra metáfora: a da navegação - muito similar à abordagem realizada em 2004 por Scheiner (que trabalhou essa idéia pela perspectiva do vôo)63. Aqui, sugere-se uma relação entre Internet e imagem impregnada de simbolismo do oceano, "um ambiente simultaneamente hostil e fascinante, com suas marés, seu ritmo oscilante e imprevisível, remetendo às idéias de desbravamento, aventura, exploração e fascínio pelo desconhecido". O termo navegação designa a arte de conduzir uma embarcação, "aeronave, astronave ou outro veículo” - remetendo à imagem do barco como um “pedaço de espaço flutuante, um lugar sem lugar, que vive por si mesmo, que é fechado em si e ao mesmo tempo lançado ao infinito do mar”.
Outra metáfora é a do portal no ciberespaço: portais são considerados por Bachelard “cosmos do entreaberto” – e esquematizariam “duas possibilidades fortes, que classificam claramente dois tipos de devaneios. Às vezes, ei-la bem fechada, aferrolhada, fechada com cadeado. Às vezes, ei-la aberta, ou seja, escancarada”. Loureiro comenta que o uso freqüente da palavra portal para nomear sítios na Web remete ao limiar entre dois mundos: "o ciberespaço teria, assim, uma realidade independente e autônoma em relação ao mundo físico, constituiria um outro mundo a ser colonizado e explorado, o que retorna, de certa forma, à idéia de navegação como desbravamento". A existência de inúmeros portais ou entradas para o ciberespaço sugeriria, portanto, a inexistência de início, meio e fim. Segundo a Encyclopaedia Britannica online, o museu virtual é uma coleção de imagens digitais gravadas, arquivos de som, documentos de texto, e outros dados de interesse histórico, científico ou cultural, que são acessados através de mídia eletrônica. Esta definição compreende ser o museu virtual algo não relativo aos objetos 'reais'. O interessante neste caso está em utilizar o termo ‘objetos reais’, sem especificar se são materiais, imateriais ou digitalizados. Similares aos ‘objetos reais’ são os nomeados por Cameron como 'a coisa verdadeira' (la vraie chose). Nesta perspectiva, a maioria dos 'museus virtuais' dependeria de coleções já existentes. Ainda com referencia à idéia de museu virtual acessado em mídias eletrônicas, citemos a Enciclopédia Britânica que define os hiperlinks e recursos de multimídia dos significado, o ato de navegar associa-se à ação de percorrer a World Wide Web, seguindo ligações de forma a viajar (ou surfar) de um documento para outros. Palavras com valor semântico ou no campo semântico de navegar são: marear, velejar, sulcar, vogar, singrar Navegar.
Os meios eletrônicos de informação como possibilidades dinâmicas de acesso, podendo reunir várias fontes para apreciação e estudo; os museus virtuais, que utilizam estes recursos, poderiam então atuar como ferramentas poderosas de estudo e investigação sobre um determinado assunto. Em artigo resultante dos estudos desenvolvidos pelo projeto de pesquisa Termos e conceitos da Museologia, desenvolvido desde 2005 na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Lima e Mendes apresentam alguns resultados obtidos com os termos estudados, relacionados a museu virtual. A palavra virtual teria relação com coisas que existem no mundo real e que são digitalizadas, bem como criadas no computador e sem existência física.
Para os autores, o ciberespaço fornece novas perspectivas no âmbito da comunicação em museus: nele, o Museu não mais estaria restrito a um espaço físico, podendo manifestar-se no espaço virtual, desterritorializado. O referido trabalho, com base em levantamento de museus na Internet e em textos das áreas de Museologia e Ciência da Informação, defende ser possível identificar outros conceitos de museu virtual, a partir de três grupos:
Grupo 1 – O museu e coleções existem através de meios de comunicação virtual, não possuindo homólogos ou correspondentes em meio físico. Este tipo de museu possui criação e origem digital, sem correspondente no mundo físico. Museu virtual onde o original é restrito ao meio digital;
Grupo 2 – O Museu e suas coleções possuem homólogos ou correspondentes em meio físico. Resultante de digitalizações de elementos existentes no mundo real, com correspondente no mundo físico. Museu virtual convertido digitalmente;
Grupo 3 – Museu sem correspondente em mundo físico, cujas coleções são homólogos ou correspondentes do mundo físico, digitalmente convertidas. Museu virtual de composição mista, sendo o museu virtual, mas o acervo digitalizado.
Como forma de comprovar tal pensamento - estruturado, de modo muito interessante, em três categorias/ grupos – os autores realizaram levantamentos de museus que possuem o termo ‘virtual’ em seus títulos. Foram trabalhados cerca de oitenta e nove museus que se intitulavam virtuais. Analisando os resultados encontrados, vale ressaltar a presença do Museu da Pessoa, listado entre os museus virtuais pesquisados e incluído no grupo 1, onde museu e coleção não possuem correspondentes no mundo físico. Nesta pesquisa, podemos perceber que todos os museus são considerados virtuais, contudo, em alguns casos, combinando fatores digitais. Os museus virtuais analisados são restritos à Internet, manifestando-se através de computadores. Quanto à definição especificar se determinado museu pode ou não se intitular virtual não faz com que este deixe de existir.
Quem concorda com tal proposta é Karp, que compreende ser museu essencialmente o que o público aceita como museu e aquilo que a comunidade profissional reconhece como tal.
Como forma de comprovar tal pensamento - estruturado, de modo muito interessante, em três categorias/ grupos – os autores realizaram levantamentos de museus que possuíssem o termo ‘virtual’ em seus títulos. Foram trabalhados oitenta e nove museus que se intitulavam virtuais. Vale ressaltar, na análise dos resultados memória do computador ou nos aparatos da realidade virtual. Recria-se continuamente, e não tem limites. No museu virtual, o homem tem uma relação inusitada com o tempo, o espaço, a matéria e com a sua própria capacidade de criar e de pensar-se” (English version, Tereza Scheiner).
Nesta pesquisa, podemos perceber que todos os museus são considerados virtuais, combinando, em alguns casos, fatores digitais. Os museus virtuais analisados são restritos à Internet, manifestando-se através de computadores. Os autores entendem que o fato de a definição especificar se determinado museu pode ou não se intitular virtual não faz com que este deixe de existir. Quem concorda com tal linha de raciocínio é Karp, que compreende ser museu essencialmente o que o público aceita como museu e aquilo que a comunidade profissional reconhece como tal.
Vale questionar se a comunidade profissional inclui, em seu processo de reconhecimento, estudos terminológicos e conceituais quando criam museus e os qualificam como virtuais. Para Schweibenz, os museus virtuais carecem de uma definição e revisão do termo. Independente do nome que tenham - museus on-line, museus eletrônicos, hypermuseus, museus digitais, cybermuseus, web museus -, a idéia é a construção de uma extensão digital do museu na Internet, um museu sem paredes.
Alguns acreditam na possibilidade de criação de um world-wide virtual museum, que possa reunir objetos digitais provenientes de coleções de museus de todo o mundo. Para o autor, existiriam as seguintes categorias de museus existentes na Internet: museu folheto (brochure museum), museu do aprendizado (leaming museum) e museu de conteúdo (content museum), além do museu virtual (virtual museum). O museu folheto seria uma apresentação digital do museu existente em meio físico, uma página eletrônica sobre um determinado museu, com informações sobre cobrança, contato, base de dados, etc. Já no museu do aprendizado ou no museu de conteúdo as coleções são apresentadas em um formato encadeado, com estrutura de banco de dados. É mais útil para especialistas, uma vez que os conteúdos não são disponibilizados de forma didática. Objetiva-se, com este tipo de museu, fornecer um retrato das coleções de um museu existente em meio físico. Ainda segundo Schweibenz, o museu virtual não exporia objetos reais aos visitantes - como os museus presenciais considerados tradicionais - por sua natureza digital. Para Schweibenz, o museu virtual poderia estender as idéias e conceitos das coleções existentes em meio físico para o espaço digital, revelando, desta forma, a natureza essencial do museu e ao mesmo tempo chegando ao visitante virtual, que nunca teria condições de visitar pessoalmente determinado museu.
Para Schweibenz, a conectividade não significa apenas a ligação entre objetos, mas a possibilidade de fornecer aos visitantes a oportunidade de se concentrar em seus interesses especiais, em um diálogo interativo com o museu: é a qualidade que permite que o 'museu virtual' transcenda as capacidades do museu tradicional. Para ele, o museu virtual pode ser uma cópia de um museu físico reproduzido na Internet. Permanece assim a indefinição dos autores do campo sobre o que seria o Museu Virtual. Para Schweibenz, é um meio que possibilita acesso pelo uso da nova tecnologia da Informação: faz uso de uma dimensão digital, fortalecendo os objetos - e pode estar representado sob a forma museu eletrônico, museu digital, museu online, museu hipermídia, meta-museu, Web museu, Cyberspace museum, ou cibermuseu. Para Schweibenz, as três primeiras categorias se referem a páginas eletrônicas de museus que existem fisicamente; o museu virtual existiria exclusivamente na Internet, sendo o seu espaço e exposição restritos à Internet. Contudo, o autor diz que a natureza deste museu seria digital. Já para Carvalho, o museu virtual seria “aquele construído sem equivalência no espaço físico, com obras criadas digitalmente, não sendo substituto equivalente ou evolução dos primeiros”. Esta proposição se alinha à de Scheiner, denotando a origem da fundamentação teórica das autoras: a interface entre os campos da Museologia, da Ciência da Informação e da Comunicação.
Voltemos, então, ao conceito de virtual, o qual é mais amplo em sua origem. Como nos mostra a gênese da palavra, o virtual teria uma definição mais ampla. Sua origem vem do latim virtualis, derivado de virtus, que quer dizer força, potência. Está em transformação, implica complexidade. É problemático e circunstancial. Não soluciona, problematiza, por possuir um grau de indeterminação de seu processo. Implica liberdade. Para Lévy, virtual é o que existe em potência, estando em constante atualização-realização-atualização. O virtual seria, neste sentido, um constante ´vir-a-ser´, não estando constituído - e é exatamente esta a característica que desejamos enfatizar para as representações de Museu que desejamos nomear como 'virtuais'.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os museus utilizados como estudo de caso na dissertação que originou este artigo são o Museu da Pessoa e o Temporary Museum of Permanent Change Museu Temporário da Mudança Permanente.
Segundo Karen Worcman, o Museu da Pessoa surge como uma idéia inovadora, tanto no que tange a ser um espaço que “reúne histórias de todas as pessoas“ quanto ao próprio uso da Internet. Ela afirma que o museu ‘já nasceu virtual’, por não se constituir fisicamente. E lembra que os “arquivos de história oral costumam ser acadêmicos, ou então [sediar-se] em espaços como bibliotecas públicas”, o que difere do Museu da Pessoa, que está aberto a “qualquer pessoa que pode visitar esse espaço e registrar sua história pela Internet”. Esta possibilidade “faz dele uma experiência inovadora” .
como os tradicionais museus, fundamentado em exposições em núcleos definidos, nem na estética do espaço.
O TMPC é um museu que tem como acervo preservado a “mudança”, a “transformação”, sendo esta última palavra a mais valorizada pelo diretor e idealizador do museu e seu ex-diretor de planejamento, o professor Stephen A. Goldsmith - artista, escultor, urbanista e professor associado de arquitetura e planejamento do Departamento de Planejamento Metropolitano, em entrevista concedida para a pesquisa da dissertação que deu origem a este trabalho. A página eletrônica do museu informa que este se localiza no centro histórico da cidade de Salte Lake - cidade mais populosa de Utah, nos Estados Unidos da América (EUA) – contudo, os limites do referido museu são flexíveis.
Tanto o Museu da Pessoa quanto o Museu Temporário da Mudança Permanente têm a comunidade e os grupos sociais como “enunciadores do patrimônio” , onde o conceito de perda é substituído “pela percepção da transformação como valor” . Poderíamos ligar este fato ao conceito de “patrimônio vivo”, defendido por Henri-Pierre Jeudi, onde as transformações culturais são compreendidas como parte da realidade, não sendo mais “ameaça, mas elemento constitutivo dos fluxos sociais”.
A partir dos estudos desenvolvidos para a dissertação, entendemos por museus virtuais aqueles museus que se apresentam tanto em meio digital como físico. Museu virtual seria uma manifestação do fenômeno Museu que se realiza em constante transformação (sendo, portanto, complexa), por estar em campo problemático, podendo ser desterritorializada. Seu acervo pode ser criado totalmente em meio digital, ou existir em meio físico.
Assim sendo, concordamos com Lévy, ao afirmar que virtualizar uma entidade qualquer consiste em "descobrir uma questão geral à qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa interrogação e em definir a atualidade de partida como resposta a uma questão de partida. [...] A virtualização fluidifica as distinções
instituídas, aumenta os graus de liberdade". Diríamos, então, que virtualizar é caminhar em direção à interrogação. É fluidificar as distinções. Nomear como virtual uma determinada manifestação do fenômeno Museu é compreender esta nova possibilidade. Assim, restringir o museu virtual à Internet é não compreender tal complexidade. O virtual está presente em todos os meios, pois, como afirma Deleuze e Lévy: somos rodeados de virtualidade.
Nesta perspectiva, o que interessa não é o rótulo ou a categoria em que se insere cada museu, mas a sua relação com o movimento, o processo, a criatividade, a mudança. Enquanto “um evento, um acontecimento, uma eclosão da mente ou dos sentidos, (...) instancia de presentificação dos novos modos pelos quais o homem vê o mundo” ; nos provoca a compreender, mais que classificar, esses novos museus, chamados ‘virtuais’, como ambientes de plena transformação.
Este site é o resultado de um esforço acadêmico entre a Mestra em Museologia e Patrimônio pela Unirio, PATRICIA MOURA e os alunos de graduação do curso de Museologia/UNIRIO, JESSICA BOTELHO e DIOGO NOBRE. Desenvolve-se no sentido de reunir em um só lugar os trabalhos que se dispõem a tratar do tema MUSEU VIRTUAL e UTILIZAÇÃO DO CIBERESPAÇO EM MUSEUS, atualmente pulverizados na internet, bem como repatriar digitalmente acervos brasileiros que se encontram na Europa, com fins de pesquisa.
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